Quando
recebi a divulgação de um espetáculo infantil que seria apresentado no Theatro
Guarany no dia 03 de abril de 2013, dois sentimentos surgiram. O primeiro de
curiosidade pela obra que eu desconhecia e o outro de medo pela possibilidade
de termos mais uma peça de teatro infantil com qualidade duvidosa e que trate
as crianças como seres sem senso crítico.
Já comentei
em outras críticas sobre o descaso com que alguns grupos de teatro tratam a
concepção das peças infantis. Alguns atores criam personagens tão canastras que
as crianças não demoram nem cinco minutos para se desinteressarem pela
história. Outros diretores confundem desfile de carnaval com espetáculos para
teatro e concebem encenações poluídas com fantasias em vez de figurinos;
cenários desconectados da proposta, mas que esbanjam uma suntuosidade vazia;
iluminação no estilo árvore de natal e músicas que costumam passar nos
programas da TV aberta durante os domingos, ao invés de uma trila musical
adequada ao contexto e ao público alvo.
Apesar de
fazer essa introdução, não quero dizer que o espetáculo sobre o qual escreverei
logo a seguir tenha cometido esses equívocos. Mas, sempre que se ouve falar de
uma peça de teatro infantil, todas essas situações se tornam recorrentes e
fazem necessárias de serem trazidas ao contexto de toda crítica teatral para
que os leitores, quando forem ser espectadores de tais espetáculos, já se
desloquem de suas casas com o olhar aguçado. Tomara que essas advertências já
sirvam como estímulo a você que está lendo esse texto para criticar e negar os
próximos espetáculos infantis que venha a assistir e se enquadrem nas
características descritas acima. Os ganhadores dessa postura serão as crianças,
pela exigência de qualidade superior nas peças de teatro que lhes são
ofertadas.
O espetáculo Céu
e Terra, Água e Ar, Tudo Fede Sem Parar..., baseado no texto alemão Wasser in Eimer, de Reiner Luckner e Stefan Reisner, tem a direção de
Camilo de Lélis,
dramaturgia de Ramón Berta Wayne, adaptação de José Lutzemberger, até que tem
uma boa intenção ao se propor a contar uma história que incentiva o valor e a
preservação do meio ambiente. No entanto, a história não saiu do palco. As
crianças não se identificaram e não “viajaram” no enredo. Isso se tornava
perceptível pelo fato da enorme dispersão das crianças, além da agitação de
costume em uma peça infantil. As crianças não prestavam atenção na história e
mais queriam brincar na plateia do teatro, do que prestar atenção na peça.
Possibilidades para essa rejeição das crianças são
inúmeras. Nesse sentido, vou me ater apenas as que acredito que pudessem ser
resolvidas facilmente pelo diretor do espetáculo. Em primeiro lugar, um teatro
como o Guarany que possui um sistema acústico direcionado para grandes
espetáculos musicais, sempre causa um enorme problema aos atores, já que esses
não costumam ter a técnica vocal dos cantores de ópera para conseguirem ser
ouvidos em todos os cantos da plateia. Sobretudo, em um espetáculo infantil,
onde sabemos que as crianças sempre permanecerão conversando e se manifestando
durante toda a apresentação. Esse fato demanda que os atores tenham uma técnica
vocal impressionante para que suas vozes consigam se sobressair as dos
espectadores.
Mas, no caso do Teatro Guarany, fazer uma
apresentação para o público infantil é quase que uma tortura para o elenco, já
que a acústica do teatro não lhes favorece. Desse modo, acredito que caberia ao
diretor constatar esse problema e providenciar microfones ao elenco para que as
crianças pudessem ao menos terem escutado a história da peça. Talvez, esse
tenha sido um dos motivos pelos quais os espectadores se mostravam tão
desinteressados, pois eles, simplesmente, não ouviam o que estava acontecendo.
Sobre o elenco formado por Evandro Soldateli,
Lisandro Bellotto, Elisa Lucas e Ana Schneider, destaco as participações dos
dois atores, uma vez que seus esforços em se fazerem ser ouvidos obtinham
melhores resultados. O destaque ficou para Evandro que conseguia desenvolver
uma relação mais próxima com a plateia e controlá-los com mais facilidade que o
resto do elenco, além de conseguir ter um volume vocal que lhe favorecia.
Algumas piadas fáceis e soluções simplistas para a
história não funcionaram em nenhum momento. Além disso, me parecia que o texto
continha piadas que apenas os adultos compreenderiam o subtexto delas. Todas
elas eram desnecessárias à história daquelas personagens.
Outro fator me incomodou bastante foi a iluminação.
O espetáculo foi muito mal iluminado. A maior parte do tempo havia pouca
luminosidade. Os espectadores já estavam com dificuldade de ouvir os atores e
ainda havia pouca luminosidade. As cenas eram escuras, sem terem a necessidade
de ser. Não era uma opção estética de encenação. Se foi, ela estava incoerente
com todo o resto do espetáculo. Além disso, apesar do equipamento de iluminação
presente no local, os focos estavam mal afinados, criando sombras inclusive nos
lados do palco, desviando a atenção a cada vez que eram acessos.
O público infantil carece de espetáculos teatrais.
Porém, isso não significa que devemos descuidar da qualidade do produto
artístico que ofertamos às crianças. Essas experiências e vivências serão
importantíssimas na formação de plateias futuras e no desenvolvimento do senso
estético dessas pessoas. Por esse motivo, reforço a necessidade de olharmos
para o teatro infantil com olhos mais respeitosos e não o encararmos como uma
fatia mercadológica de venda fácil para os espetáculos de teatro.
Mesmo tendo uma sensação desagradável em relação a esse
espetáculo, saliento que todos os artistas envolvidos nessa montagem são
bastante reconhecidos pela sua competência no meio artístico. Inclusive,
observei o estado de exaustão que os atores ficaram após a apresentação, dadas
as condições estruturais da casa de espetáculos. Porém, todas essas questões
deveriam ser mais cuidadas pela produção da peça ainda durante o seu processo
de ensaios.
Vagner Vargas
Ator – DRT: 6606
Crítico de Teatro
Nenhum comentário:
Postar um comentário